ABUSO SEXUAL. Segredo Familiar.


Ao mesmo tempo, vale ressaltar que a síndrome do segredo também afeta familiares e pessoas que convivem com a família. Não só pelo fato de o abuso sexual ser  naturalmente um tabu do qual se evita falar, mas também porque, conforme explica Furniss, a dinâmica de violações pode acabar se configurando como fator equilibrante da vida familiar.
Não são poucos os relatos de crianças que afirmam e mesmo assim foram desacreditadas. "Frequentemente encontramos crianças que dizem tentar contar às suas mães, e outros membros da família ou pessoas de fora, mas temem não serem acreditadas, serem chamadas de mentirosas e serem castigadas pela revelação", diz Furniss em seu livro. De acordo com Rita de Cássia Tassi, essa descrença acontece "porque os abusos sexuais passam a ter determinadas funções na vida familiar".
A primeira dela, diz a psicóloga, chamada de evitação do conflito, acontece em famílias que precisam manter um funcionamento global satisfatório e o casamento é idealizado, sendo que há dificuldade para reconhecer o abuso sexual ou qualquer outro problema de cunho sexual.'nestes casos, ambos os pais podem voltar-se contra uma criança específica, enquanto outra é eleita como especial pelo abusador, que mantém com ela um relacionamento incestuoso altamente secreto", qualifica. A segunda função possível é a de regulador de conflitos, na qual o pai é mantido na família graças ao abuso. " Varias crianças podem estar envolvidas de ambos os gêneros, sendo que isto tende a resultar em uma competição acirrada entre os irmão, que disputam a atenção do abusador", explica, acrescentando que, neste cenário, "a família volta-se contra o mundo externo e contra as crianças".
Segundo a OMS, o abuso sexual infantil é o envolvimento de uma criança em atividade sexual que, em função de seu desenvolvimento, ele ou ela não compreende completamente. Para a professora do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia, em Minas Gerais, Anamaria Silva Neves, a construção do vínculo está apoiada numa aliança inconsciente. O sujeito incestuoso, ou o "predador psíquico", ocupa um espaço de controle e é movido pelo movimento narcísico.
Um dos grandes problemas nesses casos é o silêncio das vitimas, o que dificulta o fim do abuso. Segundo Anamaria, as crianças e adolescentes manifestam a dor, o desenvolvimento e a revolta de diversas formas.
E o silêncio, comum nesses casos, pode estar denunciando o medo e o desamparo da criança diante do adulto poderoso e abusador.
E já elas não falam "com todos as letras" o que está acontecendo, é importante, segundo a especialista, prestar atenção aos sinais que podem demonstrar. "A escola é o principal lócus, o lugar de escuta priveligiado. Crianças que sofrem violência podem sinalizar e manifestar os sintomas nos desenhos, nas dificuldades escolares, nos relacionamentos entre pares ou mesmo em comportamentos antissociais", diz Anamaria.
No entanto, não há, segundo a especialista, um padrão de comportamento a ser observado na criança violentada sexualmente. "Existem inúmeros casos em que assistimos as crianças chamadas 'precoces' ou 'superadaptadas' em movimentos sintomáticos e difíceis, exibidos em fazes posteriores à violência sofrida", lembra.
Para Anamaria, o fundamental é compreender que uma criança está inserida em um contexto e, a depender dos recursos da família, em parceria com os serviços de uma rede de assistência, a criança pode resgatar e edificar possibilidades de elaboração da vivência traumática.
FONTE: Agência Notisa de jornalismo científico

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